sábado, 27 de outubro de 2007

Breve análise sobre "O ano em que meus pais sairam de férias"

O cinema da retomada tem reconstruído nas telas a história do regime militar brasileiro, período trágico e recente, entretanto esquecido dentro da nossa sociedade. Discutir hoje o golpe militar de 1964 e seus desdobramentos é parte essencial para que nos lembramos que pessoas lutaram e morreram para que tivéssemos a arbitrária, contudo estável democracia de hoje. Em tempos nos quais revolucionários e utopias estão em baixa, continuamos “cordiais” na periferia do capitalismo, com inúmeros problemas sociais e mantendo esperança de que nosso Estado extremamente burocrático e endividado lance mais um “pacotaço” mágico para que enfim, da noite para o dia, ingressarmos no primeiro mundo. Dos filmes que abordam o tema aquele que me angariou mais simpatia foi “O Ano Em Que Meus Pais Saíram De Férias” de Cão Hambúrguer, explico, um golpe militar ou uma revolução, movimenta inúmeros rumos de vida simultaneamente, porém nem todas as pessoas se preocupam de fato com política ou assumem uma ideologia, pelo contrário elas estão preocupadas com outros assuntos: renda, família, futebol, religião, relacionamentos, mas são afetadas pelas decisões políticas do meio social independente da vontade, sendo assim, o grande mérito desta produção foi não fazer um filme sobre a ditadura e sim tendo ela como exterior, onipresente e coercitiva, demonstrada partindo de um simples garoto que teve os pais exilados para o social revelando como o regime através do medo e da força afetou e deixou cicatrizes na vida de inúmeras pessoas tão diferentes entre si.

O Brasil pensa seu “povo” como acomodado e alienado, esquecendo que esta característica esta enraizada na estrutura paternal e na baixa instrução; que reduz a flexibilidade intelectual, as perspectivas e a capacidade de raciocínio articulado, além disso, existem as políticas assistencialistas. Mobilizações são consideradas como sinônimo de perigo e merecem uma única resposta: a repressão policial ou o desprezo. A colonização deixou no inconsciente coletivo a sensação de que desenvolvimento é sinônimo de extrair e comercializar. Fala-se em fraqueza da sociedade civil para designar a ausência de entidades e organizações sociais que articulem demandas e reivindicações. Esperar que o Brasil vá as ruas exigir mudanças é desconhecer a realidade do país. Os veículos de comunicação de massa monopolizam as informações e o consenso é confundido com unanimidade enquanto a discordância é posta como ignorância, atraso ou com receio, pois entraria em conflito com as opiniões das “pessoas de bem”. Tudo isso não começou com a ditadura, existia antes e permanece.

"O ano em que meus pais sairam de férias" é um excelente filme, muito acima de qualquer filme americano que estreou no cinema este ano e isto nao é querer fazer média e sim reconhecer o valor desta obra. É uma pena que poucos assistiram, ainda vou escrever mais sobre o cinema nacional, que tem produzido gratas surpresas mesmo com pouco dinheiro e e expectativa.

A Lei Ancine tem seus prós e contras, se por um lado financia produçoes de qualidade como esta, por outro, o filme "fica pago", ou seja nao precisa dar lucro, entao é exibido apenas em festivais que ocorrem na maioria dos casos só em grandes centros, eu confesso, vi o filme em casa, o baixei da net, como muitos outros o fizeram e fazem.

Ai caimos na discussao que é semelhante a da profissao de socólogo, temos de mostrar mais nossos trabalhos, pois só assim teremos o reconhecimento que tanto necessitamos e almejamos.Talvez este seja o filme até hoje com mais chances de conquistar o Oscar. Tropa de Elite é um grande filme, no entanto seria no mínimo injusto ele competir, tendo em vista que foi lançado as pressas, uma manobra política no mínimo arbitrária. Fica desde já registrada a torcida.

1 comentários:

Raphael Dias disse...

No blog de uma jornalista do Globo:
"Começaram esta semana as exibições de filmes estrangeiros para as “chaves” formadas dentro da Comissão da Academia. E, num post bem interessante do Hollywood Elsewhere, O Ano Em que Meus Pais Saíram de Férias aparece na lista de títulos que estão sendo esperados/ bem falados. Por que este post é de alguém que assumidamente sabe muito pouco sobre cinema-não americano e, portanto, revela um olhar muito semelhante ao da maioria da mídia quando confrontada com esse “espinhoso” problema…"

Parece que olharam pra cá... Ainda não tive oportunidade de ver o filme, fiquei sabendo que ele voltaria aos cinemas por causa dessa indicação à concorrente de oscar. verei.